26/11/2008

Desabafo

Desabafo

Eu disse que o amava. E que queria ser a melhor companheira que um homem desejaria ter. Ele sorri e me olha com a cara mais boba do mundo. Ele não quer mais nada, a não ser a única coisa que eu também quero. Fechamos os olhos. Nos beijamos pela mente, com a força do pensamento.
Eu amo você, eu amo você, eu amo você. Repito sem querer, umas mil vezes, tão devagar, que quase sinto o gosto das palavras na boca... e elas derretem, são mornas e doces.

13/11/2008

Eu sonhei com ele

Eu sonhei com ele

Dormir à tarde seria bom, não fosse pelos pesadelos que tenho.
Eu sonhei com ele. Justo ele. E havia quase cinco anos que eu o desconhecia.

13 de Junho (ou Julho) de 2003.

Ele está em uma festa, embriagado, a quase 200 quilômetros de sua casa. O álcool lhe sobe a cabeça e ele quer um peixe. Sai de carro, em direção à sua cidade, mais ou menos 1 e meia da madrugada. Ele é negro e tem uma filha de 10 anos de idade, que no outro dia ficaria sabendo da morte do seu pai, pela boca de gente que nunca tinha visto. Foi em uma curva. Traumatismo craniano, objeto contundente e mais um motivo que não me recordo agora.

No sonho ele veio de carro. Não consegui ver se era o carro do acidente. Havia tanto tempo que não nos encontrávamos que seu rosto parecia diferente. Não me recordo de nenhuma emoção quando o vi. Só sei que o abracei. E perguntei porque passou tanto tempo fora. Eu nunca havia sonhado com ele, essa era a minha chance de matar as saudades.
Onde esteve todo esse tempo, eu perguntei. Fui cuidar da minha vida, a resposta grossa que recebi.
Pai, eu pensei que tivesse morrido. Não, eu não morri, estou com você agora.
Meu pai está de volta, meu pai está de volta, meu pai está de volta e o despertador toca. Não, eu não quero acordar, mas já são sete da noite e o sonho tem que chegar ao fim.

Meu pai está de volta e eu não sei como se chora.

11/11/2008

Segredo

Segredo

O menino da carteira ao lado está rasgando um papel. Ele fez isso três vezes, dobrou ao meio e rasgou novamente. Seria um segredo? Se sim ou não, diferença não teria, pois acaba de ir pro lixo. Segredo no lixo não é segredo. Segredo no lixo é notícia. Duvida? Então eu te provo. Daqui a pouco, a faxineira pega esse lixo e coloca em um saco plástico. Esse saco pára em um enorme latão na porta da escola. Não demora muito e o caminhão da coleta aparece. O saco com o segredo se mistura e é prensado contra alimentos podres, restos de papel, garrafas de cerveja e preservativos usados. Até o fim da tarde, ele estará a céu aberto, agora não só em meio a lixo, mas também a pessoas. Pessoas que vasculham toda essa massa fétida em busca de algo que possam comer ou vender.
Um menino curioso se aproxima. Ele rasga o saco plastico com as mãos encardidas e sorri com os dentes amarelos á mostra. Encontra o papel picado, que dali a poucas horas, ele juntaria os pedaços e passaria a ser cúmplice. E o segredo não seria mais segredo, mas sim uma prova, uma marca, uma prisão, e, mais tarde uma NOTÍCIA.
Com os olhos arregalados levanta o papel com as mãos na direção da luz para ver melhor.
-Não pode ser.- Exclama enquanto perde a força das pernas.

10/11/2008

O início de tudo

O início de tudo


Aula de matemática. Sono. Vontade de escrever.
Comecemos então pelo início de tudo, que eu julgo ser na morte. É a partir da certeza da morte que o ser humano começa a pensar na sua existência na Terra, surgindo pensamentos mais ou menos assim:
“Se todo mundo vai morrer, pra que se preocupar com a vida? Pra que poupar dinheiro, fazer comida, assistir televisão e escrever carta de amor se um dia todos iremos simplesmente morrer?”
A morte, além de inevitável, é imprevisível. Imagine só, minha avó fazendo os biscoitos de polvilho que eu tanto odeio de repente um meteoro cai em sua cabeça. A velha morre e eu me pergunto se isso é ironia do destino.
Tem gente que morre com um raio na cabeça, com coice de vaca, prego no pé e ate piercing no umbigo.
Morrem, apenas morrem.
Acredito que a vida seria mais tranqüila se todos pensassem como eu. Ao aconselhar meus filhos e netos, direi:
“Não se preocupe se todos os seus amigos te traíram, se você perdeu todo o seu dinheiro e sua mulher te chifra com quatro caras ao mesmo tempo, porque você vai morrer mesmo.”
O mais frustrante de tudo é imaginar quantos vermes vão se alimentar do meu corpo. Tomara que morram de diarréia.
Tem gente que tem medo do jeito que vai morrer. Eu não tenho. Sofrimento e dor são coisas tão relativas que muitos gostam de apanhar. Apanhar na bunda, na cara...
Tem gente que quer ter outras vidas. Pois que volte você em forma de borboleta. Eu não quero vir nunca mais.
Porque todo mundo não compra uma cerveja, vai pra beira de uma cachoeira, faz uma fogueira, olha pro céu e espera pra morrer? Porque ninguém se conforma com a própria morte. Querem viver e esquecer que um dia vão partir e deixar todo o seu trabalho pra trás.
Grande bosta escrever tudo isso se o meu fim é o mesmo do seu, pobre leitor.
Me dá licença que vou comprar algo pra beber. Descansem em paz.